Minha monografia de graduação, 2020

Graças às minhas orientadoras Luciana Salles e Gabriela Ventura, além do projeto de extensão Grupo de Estudos Interdisciplinares: Linguagens, Mídia e Cultura Pop da UFRJ, eu pude enfim concluir minha graduação na área de Letras (Portuguê-Inglês) com uma monogafia sobre a linguagem do videogame. O texto completo pode ser acessado no repositório oficial de monografias da UFRJ: https://pantheon.ufrj.br/handle/11422/13922

Difícil resumir a complexidade do assunto em poucas palavras, então vamos com o resumo formal mesmo:

PONTES, André Alves. O videogame como linguagem artística: elementos estéticos e discursivos nos jogos eletrônicos. 67f. Monografia (Bacharelado em Letras – Português/Inglês) – Faculdade de Letras, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2020.

O objetivo desta monografia é demonstrar de que forma o videogame pode ser compreendido enquanto linguagem artística, identificando seus principais elementos estéticos e discursivos e propondo uma abordagem tanto ludológica quanto intersemiótica para a análise e interpretação de jogos eletrônicos. Para isso, em primeiro lugar, os principais elementos artísticos que compõem o videogame serão comparados com aqueles das outras artes que o antecederam, de
forma a destacar suas diferenças e similaridades numa perspectiva semiológica. Em seguida, através da bagagem teórica própria da Ludologia, será proposta uma abordagem interdisciplinar que destaca os principais elementos artísticos próprios da interação participativa, cuja estrutura é estabelecida pela arte do game design. Além disso, para concluir,
será feita uma breve análise da relação entre arte e tecnologia, destacando seu papel na história do videogame e na formação de seus gêneros e movimentos artísticos próprios.

SPIRITUS MALIGNOS

Era domingo, já tinha anoitecido. 

Eu voltava do cinema depois de um filme bobo de comédia que acabou mais tarde do que eu pensava. Eu fiquei preocupado dela voltar sozinha, mas ela me garantiu que morava do lado do metrô. Não precisava ir com ela. Não tinha problema. Pegamos o metrô juntos e ela desceu uma estação antes da minha.

– Tem certeza?

– Tenho!

Ela me deu um beijo rápido antes de sair. Eu não esperava. Não fazia muito tempo que a gente tinha se conhecido, mas talvez aquilo tivesse ficando mais sério do que eu pensava. Sei lá, também podia não significar nada…

Saindo da estação, as ruas pareciam ainda mais escuras e desertas. Olhei o celular e os números mostravam que eram 23h54. Também tinha uma mensagem dela dizendo que já tinha chegado. Foi rápido. Agora era minha vez de chegar em casa. Guardei o celular no bolso e segui em frente.

Não tinha ninguém na rua. Eu andava ouvindo o som dos meus próprios passos e dos poucos carros que passavam de vez em quando. Foi assim, no silêncio da cidade, que eu comecei a escutar aquelas vozes estranhas. Parecia uma música distante. Na verdade, era um canto bonito, calmo e melódico. Mas também era triste de alguma forma…

Todos os dias, eu passava por essa igreja no caminho: Igreja de São Miguel. Nunca prestei muita atenção. Parecia antiga, importante de alguma forma, mas sinceramente não conheço esse tipo de arquitetura direito. Era de lá que vinha aquela música afinal de contas. Eu percebi que era uma oração.

(mais…)

The Mandalorian, 2019

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Essa foi a primeira coisa que eu assisti na década de 2020 e não vai ser superada tão cedo. Eu já tinha percebido desde o primeiro episódio (e as suspeitas eram altas desde o trailer com Werner Herzog), mas agora terminei essa obra-prima e já posso afirmar com certeza: essa é 100% sem dúvidas a melhor coisa que já foi feita no universo Star Wars, um dos melhores spin-offs de forma geral e até mesmo uma das top melhores séries que eu já vi na vida. Fazia tempo que eu não tinha literalmente a sensação física de AMOR perante uma obra de ficção.

Pra ilustrar o nível, eu só não digo que supera fácil o desenho do Samurai Jack (uma das referências máximas de qualidade na minha vida) porque sinceramente acredito que The Mandalorian não poderia nem sequer existir sem o trabalho do Tartakovsky (em Samurai Jack e no próprio desenho do Star Wars), ou no mínimo porque ambos bebem das exatas mesmas fontes. Junto com o bom e velho Indiana Jones e o jogo Uncharted (ou mesmo Tarantino e Neuromancer numa curva talvez meio inusitada), esse é exatamente o tipo de compilado que eu não consigo resistir quando mistura tudo que há de mais legal ao mesmo tempo. The Mandalorian é do mesmo nível pra cima, e eu considero esse nível altíssimo.

Afinal de contas, era exatamente isso que Star Wars sempre devia ser desde o início: uma mistura de faroeste com samurai, fantasia e ficção-científica. Uma salada de prazeres estéticos e narrativos tão primordiais que parecem quase universais. Níveis literalmente mitológicos. Ou em outras palavras mais humildes: simplesmente um clássiquíssimo irresistível da Sessão da Tarde que nenhuma crinça de 10 anos resistiria, incluindo a que ainda vive escondida dentro de cada um de nós. Assistir um negócio desse é material imediato pra voltar aos prazeres da infância: aquela vontade de desenhar, se fantasiar, brincar de boneco, simplesmente fazer parte de tudo isso. Pra não falar, é claro, numa overdose de fofura como o Baby Yoda, que desperta os instintos parentais de qualquer adulto que ainda tenha um coração.

Enfim, evidentemente não é nada profundíssimo, mas também não é assim tão raso: essa maratona de influências não deixa de constantemente tangenciar as mais variadas questões políticas e filosóficas de cada gênero que pega emprestado. Imperialismo, colonização, resistência, religião. Uma mistura das tendências anarquistas do velho oeste com tradicionalismo medieval. Embora não foque nos típicos jedis do universo Star Wars (a coisa aqui pende mais pro bom e velho faroeste intergalático), não deixa de haver também uma constante presença de algum tipo de existencialismo ou mesmo espiritualismo tipicamente oriental, sempre permeando essas pequenas fábulas do folclore futurista. Fazia tempo que a salada mirabolante do universo Star Wars não parecia tão genuína, interessante e surpreendentemente despretensiosa ao mesmo tempo. Eu nunca fui muito fã do Universo Marvel no cinema nem nada, mas eu não tenho mais argumentos pra negar que o desgraçado do Jon Favreau é um gênio.

THIS IS THE WAY. I HAVE SPOKEN. 

TRABALHO APRESENTADO NA JIC 2019

 

41ª Jornada de Iniciação Científica, Tecnológica, Artística e Cultural da UFRJ

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TÍTULO: Civilização e Barbárie: A Representação do Inimigo nos Jogos de Videogame

AUTOR: André Alves Pontes
ORIENTADORA: Luciana Salles

O objetivo desta pesquisa é explorar a representação dos inimigos nos jogos de videogame, formando uma cronologia que evidencie de que forma os personagens refletem os contextos históricos, políticos e sociais em que foram criados. De modo geral, assim como no cinema de ação, os inimigos típicos dos jogos de videogame costumam ser representados de forma maniqueísta, um “outro” caricato e desumanizado: outras nacionalidades, outras etnias, outras línguas e outras ideologias. Muitas vezes, os inimigos são desumanizados a tal ponto que são representados literalmente como monstros, alienígenas ou robôs intrinsecamente assassinos. Há, ainda, os populares “zumbis”: seres que, apesar de humanos, já estão mortos ou irreversivelmente contaminados por algo que os tornam irracionais e agressivos. Não há possibilidade de diplomacia. A única solução é a violência, o que se manifesta pelas próprias poucas possibilidades de interação com o sistema do jogo. Tudo que o jogador tem, para resolver conflitos, é uma arma.

Embora não haja estudos conclusivos a respeito do videogame como uma forma de tornar seus jogadores violentos (KHALED, 2018), a análise do discurso pode evidenciar ideologias mais complexas subjacentes aos jogos de videogame ocidentais e às mídias de entretenimento em geral. Alguns estudos indicam que as ideologias manifestas em jogos de videogame, sobretudo pela necessidade de participação ativa do jogador, podem influenciar a atitude dos jogadores com relação a grupos representados no jogo, através de uma série de processos de estereotipização (SALEEM, 2008). O objetivo deste trabalho, portanto, é identificar a representação de diversos grupos retratados como inimigos nos jogos de videogame através dos anos, passando por alemães, russos, árabes, latinoamericanos e estadunidenses.

O presente trabalho está vinculado ao Projeto de Extensão “Estudos Interdisciplinares: Linguagens, Mídia e Cultura Pop”, regularmente cadastrado no SIGProj e no Edital Rua 2019. Contando com parcerias internas e externas, o projeto se divide em um núcleo de pesquisa, a organização de eventos abertos à comunidade e atividades voltadas ao público de Ensino Médio, bem como se esforça em construir uma rede de colaboração com pesquisadores e grupos de proposta semelhante em outras universidades.

Coringa, 2019

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Todo mundo já conhece o personagem do Coringa como um palhaço perturbado, mas acho que nem todo mundo pensa nisso mais a fundo. Depois dos quadrinhos “Piada Mortal”, do Alan Moore, esse filme parece fazer o trabalho de se aprofundar no universo assustadoramente angustiante do personagem. Esse filme é sobre como uma pessoa pode sofrer a tal ponto a enlouquecer se tornar um assassino descontrolado, e não tem nada de bonito nisso.

Por conta disso, desde as primeiras imagens de divulgação, parece ter havido uma preocupação do personagem se tornar um ícone pra pessoas perturbadas, glorificando um doente mental fracassado que dá a volta por cima através da violência num mundo injusto e sem sentido. Ele poderia se tornar uma espécie de símbolo pro tipo de gente perturbada que faz massacres e depois comete suicídio. Ele poderia se tornar, de alguma forma, um ícone da “direita alternativa” se rebelando contra uma sociedade decadente, como muitos desses atiradores psicopatas costuma ser. Mas não é bem o caso no final das contas: o personagem deprimente do Coringa, na interpretação maravilhosamente angustiante do Joaquin Phoenix, é ele próprio reflexo assustador da nossa decadência.

Ele não é alguém que supera ou corrige os problemas do mundo, porque ele próprio é o sintoma da nossa doença. Ele é alguém que lamentavelmente perde todas as oportunidades de melhorar e não consegue assistência alguma, a ponto de simplesmente quebrar enquanto as coisas não param de dar errado a sua volta. Ele não vence: ele desiste. Essa aparente revolta não é nenhuma vitória, mas o lamentável auge do seu verdadeiro fracasso. O que é horrivelmente triste e pode até ser compreensível (assim como é “compreensível” saber a história de serial killers reais que viveram infâncias absurdas de abuso e violência), mas não pode ser de forma alguma romantizado ou justificado. É apenas horrível e não acho que o filme de forma alguma motive esse pensamento, por mais que esteja sempre na perspectiva do protagonista perturbado. Ele pode ser muito mais humano que o vilão caricato que já conhecemos, mas passa longe de qualquer imagem de superação ou heroísmo. Ele é alguém que dá vontade de salvar enquanto há tempo, mas é alguém que infelizmente já passou do prazo…

Enfim, depois que o filme saiu, parece que as preocupações se inverteram: o assessor de ninguém menos que outro doente mental psicopata, o Presidente do Brasil, chamou o filme de “esquerdista” e “sem Deus”.

Provavelmente pelo fato do filme mostrar uma sociedade horrivelmente desigual, violenta e corrupta, que impede qualquer possibilidade de esperança e recuperação pra alguém como o Coringa (que inclusive perde o minúsculo apoio que ainda tinha da assistência social, depois de cortarem os investimentos na área). É nítido que o personagem é vítima de um sistema falido e a carapuça logo serviu pra quem se incomodou. Mas ao mesmo tempo, pessoas na esquerda que antes se preocupavam do personagem virar um ícone problemático de direitistas indignados (“contra tudo que está aí”), agora parecem glorificar o personagem como algum tipo “anti-herói” admirável na sua revolta violenta contra os fracassos do capitalismo. Mais uma vez, definitivamente, não acho que seja o caso. Não existe absolutamente nada de heróico na vida de alguém como o Coringa, por mais nojento, horrível e injusto que seja o mundo que ele habita.

É importante saber ter empatia e admirar a construção de um personagem bem feito (e maravilhosamente interpretado), mas sem por isso admirar a pessoa que ele representa. Parece contraditório, mas não tem nada de bonito nesse sorriso bizarro.

Literatura

Independente da Mariana ter ficado ou não com o Breno, o Vitinho não tinha nada que ficar falando com o ex dela, até porque o Lucas nunca gostou dele e não tem motivo nenhum pra eles ficarem conversando. Lembra quando a Mariana quase terminou com o Lucas justamente porque ele ficava falando mal do Vitinho, debochando só porque ele é gay? Ela sempre defendeu ele. Mas agora que ela e o Lucas terminaram, o Vitinho resolveu agora que vai ficar de fofoquinha logo pra ele? Me poupe! Ele é uma bicha falsa, isso sim! Pra não falar que ele mesmo sempre falava mal do Lucas também quando eles começaram a ficar. Lembra disso? Ficava falando que ele não valia nada, que ia trair ela com outra e não sei que lá. No final, quem tá traindo a Mariana é ele fazendo isso! Eles sempre foram amigos, ela sempre defendeu ele, e agora ele vai ficar de fofoquinha com o ex dela? 

Eu sei que a Mariana tá errada também, porque ela sempre soube que o Breno era amigo do Lucas e eles já tinham até saído juntos, quando o Breno ainda tava ficando com a Lorena, aquela nojenta. Mas agora a Mari vai e pega o Breno! Ela também não se ajuda, eu sou completamente contra isso de pegar amigo do ex. Fica parecendo que a pessoa tava sempre de olho, que sempre teve um clima e tal. No caso da Mari eu até sei que não é isso. Sem falar que ela tá solteira e faz o que quiser mesmo. Mas precisava disso? Tanta gente pra pegar e ela vai pegar o Breno!

Mas enfim, de qualquer jeito não justifica fazer fofoca. Se a Mariana e Breno ficaram é problema deles, Vitinho não tem nada que ficar se metendo nisso. Vai falar pra quê? Só quer fazer intriga! Bicha falsa! Sabe o que eu acho? Eu acho bem que o Vitinho quer pegar o Lucas. Já reparou no jeito que ele sempre olha pro Lucas de cima a baixo? Parece que tá comendo ele vivo, nunca vi disso! Eu pensava que era deboche, porque o Vitinho tem esse jeito debochado, mas eu sempre achei uma coisa meio estranha naquilo. Por isso que o Vitinho sempre falava mal do Lucas, devia ser recalque! Não faz sentido? Ele louco pra pegar o Lucas e o Lucas dando em cima da Mari… Imagina como ele devia ficar? Por isso que vivia colocando problema no Lucas pra eles terminarem! Mas agora que eles terminaram mesmo, em vez de ficar do lado da Mari, ele resolve agora que vai virar amiguinho do Lucas. Me poupe! Tem alguma coisa estranha nessa história!

Mas sabe o que é pior? Eu não posso nem falar nada.

Mariana não se manca. Imagina se eu falo mal do Vitinho pra ela? Vai surtar pra cima de mim, dizer que sou homofóbica e tudo! Sendo que ela sabe muito bem que sou amiga de infância do Renan e ele é gay também. Eu sou até muito mais amiga do Renan do que ela do Vitinho. Eles só se conheceram agora. Eu conheço o Renan desde pequena e sempre fiquei do lado dele. Lembra quando teve todo aquele problema da família dele? Ele ficou na minha casa! Minha família toda conhece ele. Mas se eu falar mal do Vitinho? Vou ser a vilã da história, homofóbica e fofoqueira! Sem condições. Eu gosto muito da Mari, mas não dá pra entender como ela faz questão de defender essa víbora do Vitinho. Como é que fala? Com garras e dentes! Ela defende essa víbora com garras e dentes. Não dá pra entender isso…

No final, já vi que vai sobrar pra mim. 

Ela vai ficar assim: “ai, mas por que você não falou nada???”. Eu vou bem falar pra ela: “só não falei porque você não ia ouvir”. Já sei até o que vou falar. Ela vai ter que me ouvir pra ver se aprende. Fica defendendo o Vitinho e vai quebrar a cara quando souber. Mas enfim, deixa quieto. Deus tá vendo. Daqui a pouco chega nela e vou ficar na minha, quero nem saber. Já viu que o Lucas disse até que ia meter a porrada no Breno? 

Coisa ridícula, parece bicho.

A Culpa da Guerra às Drogas

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Vou tentar resumir uma equação que devia ser óbvia: o tráfico ilegal de drogas só existe porque as drogas são proibidas, e não porque existem consumidores. O problema é a proibição e não o consumidor.

Basta raciocinar: não faz sentido responsabilizar o consumo, porque é perfeitamente possível haver consumidores de drogas e mesmo assim NÃO EXISTIR crime organizado fazendo tráfico ilegal. Basta descriminalizar – se as drogas não forem ilegais, os consumidores podem existir e toda a violência ligada ao tráfico de drogas vai acabar. Não vai haver guerra entre facções por causa disso. Policiais não vão matar e morrer por causa de plantas. Não vai mais haver motivos pro tráfico existir, assim como não existe da mesma forma com cervejas, cigarros, café ou qualquer produto legalizado.

Não importa se as drogas fazem bem ou mal (inclusive drogas piores são legalizadas): isso é um problema de saúde e não de segurança pública. Além do mais, isso gera empregos e arrecadação de impostos (além de novas possibilidades de pesquisas e produtos médicos), em vez de cada vez mais gastos com violência inacabável. Ou seja: o que gera a violência do tráfico não é o consumo por si só, mas o consumo ligado a uma proibição sem sentido e que simplesmente nunca funcionou. Finalmente, no Século 21, diversos países estão finalmente começando a entender como resolver o problema (Estados Unidos, Canadá, Uruguai, Portugal…).

Enfim, existe uma única solução pra acabar com a violência do crime organizado e da polícia no combate insano ao tráfico de drogas: a descriminalização. Nenhuma outra estratégia funciona e nunca funcionou. É impossível vencer a Guerra às Drogas. Não existe isso de prender ou matar o último traficante do mundo e a guerra acabar. Se alguém está vencendo, insistentemente, são as drogas. Lei Seca proibia o álcool nos Estados Unidos e nunca funcionou, aumentou o crime organizado e trouxe mais problemas do que soluções . No final, precisaram descriminalizar a bebida de novo. Não tem escapatória: a única forma de acabar com essa guerra é não guerrear – ou ela acaba de vez ou continua pra sempre, durante séculos, contabilizando cada vez mais mortes e sem nunca chegar a lugar nenhum. Infelizmente, ainda existe quem prefira a segunda opção.

(imagem da empresa MedMen na Califórnia, Estados Unidos)

Meu Primeiro jogo como Roteirista e Game Designer, 2019

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Meu primeiro jogo independente numa pequena equipe inteiramente da UFRJ, feito milagrosamente em menos de um mês por completos amadores.

Pra quem não sabe dessa maravilha (eu mesmo não sabia até começar o processo seletivo desse ano): existe uma organização de desenvolvedores de jogos na UFRJ chamada GDP – mais do que programadores, eles contam também com artistas, músicos, roteiristas, game designers e dubladores e tudo que precisar. Boa parte é de cursos da própria UFRJ mesmo. No meu grupo, pro trabalho final do processo seletivo, era 100% UFRJ: Letras, Belas Artes, Engenharia e Música.

Eu fui roteirista e game designer – fiz todo o texto, narrativa, sistema de regras e mapa da fase. Uma artista desenhou basicamente o jogo inteiro. Um músico fez a trilha e efeitos sonoros. Um programador implementou a coisa toda e fez o jogo funcionar.

Eu estudo videogame faz tempo, mas fazer na prática é outro nível. Não sei ainda se vamos ser selecionados (tiveram jogos realmente lindos – foram 10 no total), mas só isso já valeu a pena pela experiência. Entrando ou não, eu já posso dizer que escrevi um jogo pela primeira vez na vida. Mas né: obviamente preciso entrar porque meudeus… deu mais trabalho do que parece.

Sobre o jogo em si: não vou dar spoiler. Ficou 99% pronto, mas meu TOC não me permite a divulgação antes de revisarmos alguns detalhes e lançar um update pra finalizar de vez. Fica o teaser das images (prints reais de cenas do gameplay). É tipo isso: uma bruxa adolescente catando lixo e fazendo altas bruxarias no shopping. Fica o mistério.

[ATUALIZAÇÃO]: Eu e todo o resto da minha equipe fomos selecionados pra GDP da UFRJ no Processo Seletivo de 2019. O jogo nunca foi finalizado de fato, mas resolvi disponibilizá-lo de qualquer jeito: https://xdddre.itch.io/bruxa-de-shopping

Sobre Bacurau, 2019

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Eu não ia nem falar nada desse filme porque é basicamente impossível falar dele sem dar spoiler – e a melhor graça dessa pérola é justamente assistir sem saber de nada (como felizmente foi o meu caso no cinema). Pra quem já viu os outros filmes do Kleber Mendonça Filho e não faz ideia do que esperar desse… bem, a graça é justamente essa mesmo. Mas a surpresa pode ser tão boa quanto desagradável e eu não sei bem se recomendo pra qualquer um. No meu caso, como fanboy de Som Ao Redor e nenhum interesse em Aquarius (que assisti mas não achei grande coisa), eu não sabia muito o que esperar e a surpresa foi mais do que bem-vinda.

Sendo assim, fica o aviso: esse textão não revela o final do filme nem nada, mas é definitivamente spoiler da própria proposta maravilhosamente mirabolante da coisa toda.

Pra começar, esse filme é basicamente um faroeste de ficção-científica BR com sérios elementos de filme trash. Nível John Carpenter literalmente tocando na trilha sonora. Níveis claramente Tarantinescos de violência, mas acima de tudo comparável pela mistureba cinematográfica que combina clássicos do cinema com filmes vabagundos de exploitation. Também não perde aquele descompromissado toque de crítica social que todo filme vagabundo dos anos 70 e 80 precisam ter, mas passa longe do apelo esquerda caviar que sempre me incomodou em filmes como o próprio Aquarius do Kleber. Esse daí não tem pedantismo e chuta o balde mesmo: é o protótipo brasileiro de um episódio doido de Black Mirror que vai parar numa paródia de The Purge, tudo isso num weird west sci-fi que não é muito distante de um Westworld alucinado ou simplesmente Mad Max do cangaço. O negócio perde a linha e não tem mais sutiliza alguma na caricatura da desgraça.

Nesse sentido, é tanta bizarrice que a mera existência desse filme é uma maravilha. Meu único lamento é que a coisa toda demora pra começar e depois acaba muito rápido. Eu facilmente trocaria toda a primeira meia hora por mais meia hora de porradaria no final. Mas foi bom enquanto durou e eu não deixo de ser grato por isso. Me resta agora sonhar com Bacurau 2 – um filme que já chuta o balde desde o início porque a própria ideia de existir algo chamado BACURAU 2 é tão escrota que já me parece praticamente infalível. Banalizo mesmo e pra mim a graça é essa. Foi um alívio. Podem filosofar e se aprofundar à vontade nas críticas sociais e tudo mais (o filme dá margem pra isso e faz claros convites interpretativos, tudo bem), mas eu adianto logo: o que eu gostei MESMO foi de ver esse emaranhado mirabolante de cultura pop e faroeste pós-apocalíptico que só fica mais legal ainda no sertão nordestino.

Resta a esperança de que o cinema cult nacional produza cada vez mais pérolas desse tipo. Felizmente, no mundo inteiro, parece que a direção é essa mesmo. Ano passado, foi o filme de um monstro aquático que ganhou o Oscar. Por mim, podem continuar fazendo.